Na minha família temos um ritual relacionado com os passeios de fim-de-semana: a cada segunda-feira, após o jantar, um elemento retira de um frasco, um papelinho com um destino de passeio para o domingo seguinte. Durante o passeio, tiramos fotografias e recolhemos materiais que, durante a semana seguinte vamos organizando numa página de um scrapbook de passeios. Esta dinâmica permite dilatar a vivência de um simples passeio de 3 horas, numa experiência de quase 2 semanas – entre a expectativa de sabermos quem irá escolher o papelinho colorido dessa vez e qual o destino que será sorteado até à satisfação de contemplarmos a página com as fotos e materiais completa. Neste exemplo simples, percebemos a magia que os rituais nos trazem – a capacidade de tornar um momento comum em algo de único, precioso e específico de uma família ou grupo de pessoas. Falo muitas vezes da importância das rotinas familiares, sobretudo para as crianças mais pequenas, pois é através da previsibilidade e segurança que estas transmitem que a criança vai ganhando um progressivo sentimento de controlo sobre o mundo e a confiança necessária para o explorar. São também extremamente importantes porque, ao tornarem automática a organização das tarefas familiares, libertam-nos de termos de pensar activamente no que necessitamos fazer em determinados momentos (a decision fatigue de que tanto se tem falado). O rituais, por seu lado, não deixam de ser rotinas específicas da família, mas têm uma componente emocional tradicionalmente mais marcada. Tornando-se símbolos por excelência da identidade familiar, contribuindo para aumentar o sentimento de pertença dos elementos ao grupo e sendo um veículo de transmissão da cultura e valores familiares, muitas vezes, através das gerações. Podemos categorizar as rotinas e rituais de acordo com as funções que servem na dinâmica familiar:
Rituais e rotinas que auxiliam a definição de papéis e responsabilidades
São centrais ao desenvolvimento da criança e à conquista da sua autonomia. São também muito facilitadores na organização do dia-a-dia da família. Temos como exemplos, a atribuição de tarefas domésticas específicas a cada elemento ou a realização conjunta de projectos, tal como a decoração da casa para as épocas festivas.Rituais e rotinas que contribuem para aumentar o sentimento de pertença e promover a identidade familiar
Naturalmente, estes rituais têm um grande papel no estreitamento dos laços entre pais e filhos e na transmissão de valores. No fundo, é através deles que cada família expressa a sua forma de estar e tudo o que a torna única. São exemplos, as refeições de família, a forma como a família comemora o aniversário de cada elemento, as formas de cumprimentar e trocar afectos específicas da família ou mesmo as dinâmicas de férias ou de fim de semana.Rituais e rotinas que transmitem um sentimento de confiança e segurança e reduzem o stress
Através destes, a família assume o papel de porto de abrigo dos seus elementos. As rotinas de deitar das crianças são um exemplo de excelência, mas podem assumir inúmeras formas. Há famílias que utilizam o momento da refeição para cada elemento partilhar a sua vivência do dia, há outras que preferem ter um diário familiar e outras que decidiram que todas as manhãs devem começar com um abraço familiar. Os rituais são tão diversos e únicos como as famílias e cabe a cada uma decidir o que faz sentido para si e para cada um dos seus elementos. O que importa é compreendermos que rituais e rotinas temos implementados no quotidiano da nossa vida familiar e, em que medida, estes reflectem os nossos valores e as vivências que queremos transmitir aos nossos filhos. A cada dia temos uma nova oportunidade para pôr em prática novas rotinas e rituais que nos façam sentido e que nos coloquem no caminho que queremos trilhar enquanto família. Para tal, apenas temos de desacelerar, reflectir e direccionar o nosso tempo e foco para o que é realmente importante. Começamos hoje?